Quanto mais tempo o governador Flávio Dino levar para declarar apoio explícito ao Carlos Brandão, menos chance tem o seu vice de ganhar a eleição para governador em 2022.
Categoria: Alex Brasil
TUDO PASSA
TUDO PASSA
Eu te falei, amor, da relatividade;
que a vida é só um sopro
e depois é só saudade.
Eu te falei, amor, da tua insensatez;
que o amor tem hora e vez
e você só diz depois.
Eu te falei, amor, que a vida é tão fugaz;
se hoje eu te quero tanto,
amanhã, não quero mais.
Não quero mais saber da tua vida,
sei que és mulher fingida,
tem duas caras, tem seu preço,
teu amor é fantasia,
não merece a minha poesia.
Minha bela menina,
na vida tudo passa;
se vem depois dos males, aventura,
vem depois do vinho, a ressaca.
Razões e sensibilidades
RAZÕES E SENSIBILIDADES
A Senhora se aproximou e perguntou ao autor famoso o que o seu filho, que tinha pretensões literárias, deveria fazer para tornar-se um bom escritor. “Diga para ele começar e terminar bem uma estória.” “E no meio, o que ele faz?” Insistiu a Senhora. “Diga para ele pôr talento”.
Eis a alquimia com que Goreth Nogueira tece, como uma moderna Xerazade, driblando e exorcizando seus próprios fantasmas, essas suas estórias em 50 Tons de decisão; a revelação, em nossas letras de uma talentosa escritora a ser lida e observada com olhar criticamente positivo.
Quem lê as crônicas, ou contos, ou prosa poética de Goreth, dependendo do ponto de vista ou sensibilidade do leitor, lembra imediatamente de Cecília Meireles: “Eu canto porque o instante existe/ e a minha vida está completa./ Não sou alegre, nem sou triste: / sou poeta”.
Pois é a partir dessa perspectiva, dos instantes e das fatias da vida, que, aparentemente, são descartáveis, que a autora forja sua narrativa e visão da existência, materializando em literatura o que parecia simploriamente prosaico.
E aí, a Goreth, com sua dicção particular e seu olhar perspicaz do cotidiano, nos remete a outra escritora, prêmio Nobel de Literatura, a canadense Alice Munro, que se imortalizou como contista, fotografando com mestria, em sua obra, o deslizar simples, porém vital do comportamento humano na complexa teia contemporânea de novidades, sufocando a alegria das coisas simples ao alcance de todos nós.
Sempre na primeira pessoa, como se estivesse no divã do analista (ela diz que já fez análise), Goreth deixa sua deliciosa prosa fluir e nos envolver suavemente, nos confundindo, pois não sabemos se o que ela escreve é autobiografia, ou fingimento da vida que ela não viveu, mas gostaria de ter vivido.
Eis, então, a essência das narrativas dessa estreante e promissora cronista em nossas letras: razões e sensibilidades. Razões para, inteligentemente, tecer o seu texto, a partir de sua cultura artística; e sensibilidade para perceber na simplicidade da vida ao nosso redor, de ontem e do agora pulsante, a essência nas intertextualidades das aparências. Lembrando Freud: “Não permito que nenhuma reflexão filosófica me tire à alegria das coisas simples da vida”.
Aliás, em tom confessional, a própria autora revela o fio condutor ou approach do seu processo criativo: “Tudo me influencia, mas nada me inspira mais que minha própria vida; tudo que escrevo tem um pé no real.” E reafirma, no conto Companhia da Criança, sua linda, adeus e obrigada, a dualidade psicológica da qual flui sua necessidade interior de revelar as impressões sobre si mesma e sobre nossa condição humana peculiar no mundo e na vida: “durante longo período travei grande luta entre os desejos do coração e a prudência da razão.”
E assim, entre a sensibilidade e a razão, como quem constrói uma catedral de ideias com palavras e frases, em 50 Tons de Decisão, Goreth Nogueira alinhava uma estória na outra para pintar um painel literário revelador de talento e imaginação. Suas simples, porém, profundas experiências e observações do cotidiano e da realidade contemporânea transfiguradas em crônicas e contos, transformam-se em fina arte literária, um prêmio ao leitor e à nossa literatura.
Sarney e o Poeminha do Contra
A escritora Arlete Nogueira da Cruz Machado e eu estivemos com o ex-presidente José Sarney, em seu apartamento, na Ponta d’Areia. A manhã do dia três de abril estava iluminada e dava pra ver no horizonte trinta navios repousando na Baía de São Marcos, lembrando os barquinhos da infância, agora, ali, na calma poesia da sempre São Luís, Ilha do Amor.
Fiquei impressionado com o poeta, escritor, político e intelectual José Sarney, não pela sua genialidade múltipla, que já conheço e acompanho há décadas; mas pela sua vitalidade, lucidez, senso de humor e entusiasmo pela vida, tudo isso próximo dos seus oitenta e oito anos de idade. O Sarney morrível, parecia traduzir nos olhos vibrantes de um poeta sonhador, a imortalidade daqueles que imprimem na humanidade um rastro indelével e inesquecível. Para contrariedade dos que o invejam e para admiração dos que o respeitam e o amam.
Arlete, Sarney e eu, não falamos de política, de poder, de ingratidão, de traição, de ódio, de intolerância… Falamos de literatura somente, como três poetas iniciantes, contemplando e ainda estudando as metáforas do horizonte atlântico e profundo da Baía de São Marcos.
Mas, naquele instante, inadvertidamente, não pude deixar de lembrar, olhando o semblante sábio do decano poeta Sarney, o que dissera o também poeta Mário Quinta sobre a imortalidade e a incompreensão dos que não deixarão rastro na história humana: “Todos esses que aí estão/Atravancando o meu caminho,/Eles passarão…/Eu passarinho!”